Dīgha Nikāya 26

Cakkavatti-Sihanada Sutta

O Rugido do Leão ao Girar a Roda

Em certa ocasião o Abençoado estava entre os Magadhas em Matula. Lá ele se dirigiu aos monges desta forma: “Bhikkhus”.—“Venerável Senhor”, eles responderam. O Abençoado disse o seguinte:

“Bhikkhus, sejam ilhas para vocês mesmos, refúgios para vocês mesmos, buscando nenhum refúgio externo; com o Dhamma como a sua ilha, o Dhamma como o seu refúgio, buscando nenhum outro refúgio. E como, um bhikkhu é uma ilha para ele mesmo, um refúgio para ele mesmo, buscando nenhum refúgio externo; com o Dhamma como a sua ilha, o Dhamma como o seu refúgio, buscando nenhum outro refúgio? Quando ele permanece contemplando o corpo como um corpo, ardente, plenamente consciente e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo; quando ele permanece contemplando as sensações como sensações, … quando ele permanece contemplando a mente como mente, … quando ele permanece contemplando os objetos mentais como objetos mentais, ardente, plenamente consciente e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo, então, verdadeiramente, ele é uma ilha para ele mesmo, um refúgio para ele mesmo, buscando nenhum refúgio externo; tendo o Dhamma como a sua ilha, o Dhamma como o seu refúgio, buscando nenhum outro refúgio.

“Mantenham-se no seu próprio domínio bhikkhus , no seu território ancestral. Se vocês assim fizerem, então Mara não terá sua oportunidade, Mara não se estabelecerá. É acumulando estados benéficos que o mérito se incrementa.

“Certa vez, bhikkhus, houve um monarca chamado Dalhanemi que girou a roda, um monarca justo que governou de acordo com o Dhamma; conquistador dos quatro pontos cardeais, que estabeleceu a segurança no seu reino e que possuía os sete tesouros. Que são: a Roda Preciosa, o Elefante Precioso, o Cavalo Precioso, a Jóia Preciosa, a Mulher Preciosa, o Tesoureiro Precioso e como sétimo o Conselheiro Precioso. Ele tinha mais de mil filhos que eram corajosos e heróicos e que aniquilavam os exércitos inimigos. Ele governava tendo conquistado esta terra circundada pelo mar, sem bastão ou espada, através do Dhamma. Mas se ele deixasse a vida em família e seguisse a vida santa, então ele se tornaria um arahant, um Buda perfeitamente iluminado, aquele que remove o véu do mundo.

“Depois de muitas centenas e milhares de anos o Rei Dalhanemi disse para um certo homem: ‘Meu homem, no momento em que você vir que a Roda Preciosa tenha deslizado da sua posição, relate isso para mim.’—‘Sim, senhor,’ o homem respondeu. E depois de muitas centenas e milhares de anos o homem viu que a Roda Preciosa havia deslizado da sua posição. Vendo isso, ele relatou esse fato ao Rei. Então o Rei Dalhanemi mandou buscar o seu primogênito, o príncipe herdeiro, e disse: ‘Meu filho, a Roda Preciosa deslizou da sua posição. E eu ouvi dizer que quando isso acontecesse para um monarca que gira a roda, ele não teria mais muito tempo de vida. Eu estou saciado dos prazeres humanos, agora é o momento de buscar os prazeres divinos. Você, meu filho, assuma o controle desta terra circundada pelo oceano. Eu irei raspar o meu cabelo e barba, vestirei os mantos de cor ocre e deixarei a vida em família pela vida santa.’ E tendo instalado, da forma requerida, o seu filho mais velho como rei, o Rei Dalhanemi raspou o seu cabelo e barba, vestiu os mantos de cor ocre e deixou a vida em família pela vida santa. E sete dias depois que o sábio real havia seguido a vida santa, a Roda Preciosa desapareceu.

“Então um certo homem veio até o Rei Khattiya ungido e disse: ‘Senhor, você deve ser informado que a Roda Preciosa desapareceu.’ Em vista disso o Rei sentiu pesar e tristeza. Ele foi até o sábio real e relatou-lhe o que havia acontecido. E o sábio real disse: ‘Meu filho, você não deve sentir pesar ou tristeza pelo desaparecimento da Roda Preciosa. A Roda Preciosa não é uma herança de família. Mas agora, meu filho, você precisa se tornar um Monarca que gira a roda. E então poderá ocorrer que, se você realizar os deveres de um Monarca que gira a roda, no Uposatha do décimo quinto dia, tendo lavado a sua cabeça e ido para o terraço no topo do palácio para o dia de Uposatha, a Roda Preciosa surgirá para você, com mil raios, com a roda, o cubo, completa em todos os aspectos.’

“Mas qual, senhor, é o dever de um Monarca que gira a roda?”—“É o seguinte, meu filho: Você, na dependência do Dhamma, honrando-o, reverenciando-o, amando-o, homenageando-o e venerando-o, tendo o Dhamma como sua insígnia e bandeira, reconhecendo no Dhamma o seu mestre, você deve estabelecer guarda, defesa e proteção de acordo com o Dhamma para a sua própria família, suas tropas, seus nobres e vassalos, para Brâmanes e chefes de família, pessoas que vivam nas cidades e no campo, contemplativos e Brâmanes, para animais e pássaros. Não permita que o crime prevaleça no seu reino e para os necessitados, lhes dê o que necessitem. E quaisquer contemplativos e Brâmanes que no seu reino tiverem renunciado à vida dos prazeres sensuais e estiverem dedicados à renúncia e à nobreza, cada um se domesticando, cada um se acalmando, cada um se esforçando para dar um fim ao desejo, se de tempos em tempos eles vierem consultá-lo quanto a o que é benéfico e o que é prejudicial, o que é criticável e o que é isento de crítica, o que deve ser seguido e o que não deve ser seguido e qual ação irá no longo prazo conduzir ao dano e sofrimento e qual irá conduzir ao bem-estar e felicidade, você deveria ouví-los e dizer-lhes que evitem o mal e façam o bem. Esses, meu filho, são os deveres de um Monarca que gira a roda.”

“Sim, senhor,” respondeu o Rei, e ele realizou os deveres de um Monarca que gira a roda. E ao fazer isso, no Uposatha do décimo quinto dia, tendo lavado a cabeça e ascendido até o terraço no topo do seu palácio para o dia de Uposatha, a Roda Preciosa surgiu para ele, com mil raios, com a roda, o cubo, completa em todos os aspectos. Então o Rei pensou: “Eu ouvi que quando um Rei Khattiya ungido vê essa roda no último dia da quinzena, ele se tornará um Monarca que gira a roda. Que eu possa me tornar um monarca assim!”

“Então, levantando-se do seu assento e arrumando o manto externo sobre o ombro, o Rei tomou um vaso com água com a mão esquerda, borrifou a Roda com a mão direita e disse: ‘Gire para adiante, boa roda preciosa; triunfe, boa roda preciosa!’ Então a roda preciosa girou para adiante na direção leste e o Rei a seguiu com o seu exército. E em qualquer região na qual a Roda parasse, o Rei estabelecia residência com o seu exército. E aqueles que antes a ele se opunham na região leste vinham e diziam: ‘Venha, grande Rei; bem vindo, grande Rei; comande, grande Rei; aconselhe, grande Rei.’ E o Rei dizia: ‘Vocês não devem matar seres vivos; vocês não devem tomar aquilo que não for dado; vocês não devem agir de forma imprópria em relação aos prazeres sensuais; vocês não devem dizer mentiras; vocês não devem beber bebidas embriagantes; sejam moderados na alimentação.’ E aqueles que antes a ele se opunham na região leste se tornavam seus súditos.

“Então, a roda preciosa mergulhou no oceano do leste e emergiu outra vez. E nisso, ela girou para adiante, na direção sul … E aqueles que se opunham na região sul se submeteram ao Rei. Então, a roda preciosa mergulhou no oceano do sul e emergiu outra vez. E nisso, ela girou para adiante, na direção oeste … E aqueles que se opunham na região oeste se submeteram ao Rei. Então, a roda preciosa mergulhou no oceano do oeste e emergiu outra vez. E nisso, ela girou para adiante na direção norte … E aqueles que se opunham na região norte se submeteram ao Rei.

“Agora, quando a roda preciosa triunfou sobre a terra de oceano a oceano, ela retornou para a capital real e permaneceu como que presa pelo eixo ao portão do principal palácio do Rei, como um adorno no portão do palácio principal.

“E um segundo Monarca que gira a roda fez o mesmo e um terceiro, um quarto, um quinto, um sexto e um sétimo monarca também …. disse para um certo homem vigiar se a Roda Preciosa deslizasse da sua posição (igual ao verso 3). E sete dias depois do sábio real ter seguido a vida santa, a Roda Preciosa desapareceu.

“Então um certo homem veio até o Rei e disse: ‘Senhor, você deve ser informado que a Roda Preciosa desapareceu.’ Em vista disso o Rei sentiu pesar e tristeza. Mas ele não foi até o sábio real para lhe perguntar sobre os deveres de um Monarca que gira a roda. Ao invés disso, ele governou o povo de acordo com as suas próprias idéias, e sendo assim governado, o povo não prosperou tão bem quanto havia prosperado sob os reis anteriores, que haviam realizado os deveres de um Monarca que gira a roda. Então os ministros, conselheiros, funcionários do tesouro, guardas e porteiros e os recitadores de mantras vieram até o Rei e disseram: ‘Senhor, enquanto você governar o povo de acordo com as suas próprias idéias, diferente da forma que ele foi governado sob os monarcas anteriores, o povo não irá prosperar bem. Senhor, há ministros … no seu reino, nós mesmos inclusive, que preservaram o conhecimento sobre como um Monarca que gira a roda deveria governar. Pergunte-nos, Majestade e nós lhe diremos!’

“Então o Rei ordenou que os ministros e todos os demais se reunissem e ele os consultou. E eles explicaram os deveres de um Monarca que gira a roda. E tendo ouvido o que eles disseram, o Rei estabeleceu guarda , defesa e proteção, mas ele não atendeu as necessidades dos necessitados e como resultado a pobreza se espalhou. Com a disseminação da pobreza, um homem tomou algo que não lhe havia sido dado, dessa forma cometendo o que passou a ser chamado de roubo. Eles o prenderam e o trouxeram perante o Rei dizendo: ‘Majestade, este homem tomou algo que não lhe foi dado, que chamamos de roubo.’ O Rei disse: ‘É verdade que você tomou algo que não lhe havia sido dado—que é chamado de roubo?’—‘Sim é, Majestade.’—‘Porque?’—‘Majestade, eu não tenho nada para o meu sustento.’ Então o Rei lhe deu alguns bens dizendo: ‘Com isto, meu bom homem, você poderá se manter, sustentar sua mãe e pai, manter uma esposa e filhos, levar adiante um negócio e presentear os contemplativos e Brâmanes, o que irá promover o seu bem-estar espiritual e conduzir a um feliz renascimento com um resultado prazeroso no plano celestial.’—‘Muito bem, Majestade,’ o homem respondeu.

“E exatamente a mesma coisa aconteceu com um outro homem.

“Então, as pessoas ouviram que o Rei estava distribuindo bens para aqueles que tomassem algo que não lhes houvesse sido dado e assim elas pensaram: ‘E se nós fizéssemos o mesmo!’ E então um outro homem tomou algo que não lhe havia sido dado e eles o trouxeram perante o Rei. O Rei perguntou porque ele havia feito aquilo e ele respondeu: ‘Majestade, eu não tenho nada para o meu sustento.’ Então o Rei pensou: ‘Se eu der bens para todos aqueles que tomarem algo que não lhes foi dado, os roubos irão crescer cada vez mais. Melhor eu dar um fim nisso, dar um fim de uma vez por todas, cortar a cabeça dele.’ Assim ele ordenou aos soldados: ‘Prendam os braços deste homem para trás com uma corda forte, raspem a cabeça dele e conduzam-no ao rufar dos tambores pelas ruas e praças e para fora da cidade pela porta do sul, lá dêem um fim nele aplicando a pena capital, decepando a sua cabeça!’ E assim eles fizeram.

“Ouvindo sobre o ocorrido, as pessoas pensaram: ‘Vamos obter espadas afiadas e depois poderemos tomar de qualquer um aquilo que não nos for dado, daremos um fim em todos, daremos um fim em todos de uma vez por todas, cortaremos as suas cabeças.’ Assim, tendo obtido algumas espadas afiadas, elas se lançaram em assaltos homicidas sobre vilarejos, vilas e cidades e também se dedicaram ao roubo nas estradas, matando as suas vítimas cortando-lhes a cabeça.

“Assim, por não haver generosidade para com os necessitados, a pobreza se disseminou, do incremento da pobreza, o tomar o que não é dado se disseminou, do incremento do roubo, o uso de armas se disseminou, do incremento do uso de armas, o ato de tirar a vida se disseminou e do incremento do ato de tirar a vida, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu e como resultado da diminuição do tempo de vida e da beleza, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido oitenta mil anos passaram a viver apenas quarenta mil. E um homem da geração que viveu por quarenta mil anos tomou algo que não lhe foi dado. Ele foi trazido perante o Rei que lhe perguntou: ‘É verdade que você tomou algo que não lhe foi dado—que é chamado de roubo?’—‘Não, Majestade,’ ele respondeu, dizendo assim uma mentira deliberada.

“Assim, por não haver generosidade para com os necessitados … o tirar a vida se disseminou e do incremento do tirar a vida, a mentira se disseminou e do incremento da mentira, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu e como resultado da diminuição do tempo de vida e da beleza, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido quarenta mil anos passaram a viver apenas vinte mil. E um homem da geração que viveu por vinte mil anos tomou algo que não lhe foi dado. Um outro homem o denunciou para o Rei, dizendo: ‘Senhor, o fulano tomou algo que não lhe foi dado,’ falando assim mal de outrem.

“Assim, por não haver generosidade para com os necessitados … o falar com malícia se disseminou e como conseqüência, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu e como resultado da diminuição do tempo de vida e da beleza, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido vinte mil anos passaram a viver apenas dez mil. E na geração que viveu por dez mil anos, alguns eram belos e outros eram feios. E aqueles que eram feios, sentindo inveja daqueles que eram belos, cometiam adultério com as esposas deles.

“Assim, por não haver generosidade para com os necessitados … a conduta sexual imprópria se disseminou e como conseqüência, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu e como resultado da diminuição do tempo de vida e da beleza, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido dez mil anos passaram a viver apenas cinco mil. E na geração que viveu por cinco mil anos, duas coisas se disseminaram: a linguagem grosseira e a linguagem frívola, e como conseqüência, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu, e como resultado da diminuição do tempo de vida e da beleza, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido cinco mil anos passaram a viver, alguns, apenas dois mil e quinhentos e outros, dois mil. E na geração que viveu por dois mil e quinhentos anos, a cobiça e a raiva se disseminaram, e como conseqüência, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu, e como resultado da diminuição do tempo de vida e da beleza, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido dois mil e quinhentos anos passaram a viver apenas mil. E na geração que viveu por mil anos, o entendimento incorreto se disseminou … e como conseqüência, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido mil anos passaram a viver apenas quinhentos. E na geração que viveu por quinhentos anos, três coisas se disseminaram: o incesto, o desejo excessivo e as práticas depravadas … e como conseqüência, os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido quinhentos anos passaram a viver, alguns, apenas duzentos e cinqüenta e outros, apenas duzentos. E na geração que viveu por duzentos e cinqüenta anos, três coisas se disseminaram: falta de respeito pela mãe e pelo pai, por contemplativos e Brâmanes, e pelo cabeça do clã.

“Assim, por não haver generosidade para com os necessitados … a falta de respeito pela mãe e pelo pai, por contemplativos e Brâmanes, e pelo cabeça do clã se disseminou, e como conseqüência, o tempo de vida das pessoas diminuiu, a sua beleza diminuiu, e os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido duzentos e cinqüenta anos passaram a viver apenas cem.

“Bhikkhus, virá um tempo em que os filhos dessas pessoas terão um tempo de vida de dez anos. E com isso, as meninas estarão prontas para casar com cinco anos de idade. E assim, estes sabores desaparecerão: manteiga líquida, manteiga, óleo de sésamo, melaço e sal. Para essas pessoas o grão de kudriisa será o alimento principal, da mesma forma como o arroz e o caril (curry) são hoje. E com elas, os dez tipos de conduta virtuosa irão desaparecer por completo e os dez tipos de conduta não virtuosa irão prevalecer: para aqueles que possuírem um tempo de vida de dez anos não haverá uma palavra para “virtude” então, como poderá haver alguém que pratique ações virtuosas? Aquelas pessoas que não tenham respeito pela mãe e pelo pai, por contemplativos e Brâmanes, e pelo cabeça do clã, serão aquelas que desfrutarão de honra e prestígio. Tal como é agora com as pessoas que demonstram respeito pela mãe e pelo pai, por contemplativos e Brâmanes, e pelo cabeça do clã, que são elogiadas e honradas, assim será com aqueles que fizerem o oposto.

“Entre aqueles com um tempo de vida de dez anos ninguém irá se dar conta de mãe ou tia, da cunhada da mãe, ou da esposa do mestre, ou da esposa do pai de alguém, e assim por diante—haverá completa promiscuidade no mundo igual a bodes e cabras, porcos e porcas, cães e chacais. Entre eles, haverá forte inimizade, ódio violento, raiva violenta e pensamentos de matar, mãe contra filho e filho contra mãe, pai contra filho e filho contra pai, irmão contra irmão, irmão contra irmã, da mesma forma como o caçador sente ódio pelo animal que ele está caçando.

“E para aqueles com um tempo de vida de dez anos, haverá um tempo de ‘intervalo das espadas’ de sete dias, durante o qual eles verão um ao outro como animais selvagens. Espadas afiadas irão surgir nas mãos deles e o pensamento: ‘Ali está um animal selvagem!’ eles irão matar uns aos outros com aquelas espadas. Mas haverá alguns que irão pensar: ‘Não matemos mais ou que não haja mais mortes! Vamos para florestas remotas, rios difíceis de atravessar, ou montanhas inacessíveis, e vivamos das raízes e frutas da floresta.’ E isso eles fazem por sete dias. Então, ao final dos sete dias, eles emergem dos seus esconderijos e se regozijam em comunhão dizendo: ‘Seres bons, vejo que vocês estão vivos!’ E então o seguinte pensamento irá ocorrer nesses seres: ‘Foi só por termos nos habituado aos modos ruins e prejudiciais que sofremos a perda dos nossos semelhantes, façamos o bem! Que coisas boas poderemos fazer? Vamos abster-nos de tirar a vida—essa será uma boa prática.’ E assim eles se abstêm de tirar a vida e, tendo adotado essa ação benéfica, eles a praticarão. E por ter realizado essas coisas benéficas, o seu tempo de vida se incrementa e a beleza se incrementa. E os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido dez anos passaram a viver vinte anos.

“Então irá ocorrer a esses seres: ‘É pela adoção de práticas benéficas que incrementamos nosso tempo de vida e a beleza, portanto, dediquemo-nos ainda mais a práticas benéficas. Vamos nos abster de tomar aquilo que não nos for dado, da conduta sexual imprópria, da linguagem mentirosa, da linguagem maliciosa, da linguagem grosseira, da linguagem frívola, da cobiça, da má vontade, do entendimento incorreto; vamos nos abster de três coisas: incesto, desejo excessivo e práticas depravadas; vamos ter respeito pela mãe e pelo pai, por contemplativos e Brâmanes e pelo cabeça do clã e vamos perseverar nessas ações benéficas.’

“E assim eles farão essas coisas e como conseqüência disso o seu tempo de vida e a beleza se incrementarão. Os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido vinte anos passaram a viver até quarenta, os filhos deles passaram a viver até oitenta, os filhos deles passaram a viver até cento e sessenta, os filhos deles passaram a viver até trezentos e vinte, os filhos deles passaram a viver até seiscentos e quarenta; os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido de seiscentos e quarenta anos passaram a viver até dois mil anos, os seus filhos passaram a viver até quatro mil anos, os filhos deles passaram a viver até oito mil anos e os seus filhos passaram a viver até vinte mil anos. Os filhos daqueles cujo tempo de vida havia sido de vinte mil anos passaram a viver até quarenta mil anos e os filhos deles passaram a viver até oitenta mil anos.

“Entre aquelas pessoas com um tempo de vida de oitenta mil anos, as meninas estarão prontas para casar com quinhentos anos de idade. E essas pessoas conhecerão apenas três tipos de enfermidades: desejo, jejum e envelhecimento. E na época dessas pessoas, este continente de Jambudipa será poderoso e próspero; vilarejos, vilas e cidades estarão muito próximas uma das outras. Jambudipa, tal como Avici estará tão cheio de gente quanto uma mata está cheia de capim e arbustos. Nessa época, a Benares de hoje será uma cidade real denominada Ketumati, rica, próspera e populosa, repleta de gente e bem suprida. Em Jambudipa haverá oitenta e quatro mil cidades lideradas por Ketumati como a capital real.

“E na época das pessoas com um tempo de vida de oitenta mil anos, irá surgir na capital Ketumati um rei chamado Sankha, um monarca que irá girar a roda, um monarca justo de acordo com o Dhamma, conquistador dos quatro pontos cardeais… (igual ao verso 2).

“E na época das pessoas com um tempo de vida de oitenta mil anos, irá surgir no mundo um Abençoado chamado Metteyya , um arahant, perfeitamente iluminado, consumado no verdadeiro conhecimento e conduta, bem-aventurado, conhecedor dos mundos, um líder insuperável de pessoas preparadas para serem treinadas, mestre de devas e humanos, desperto, sublime. Ele irá declarar—tendo realizado por si próprio com o conhecimento direto—este mundo com os seus devas, maras e brahmas, esta população com seus contemplativos e Brâmanes, seus príncipes e povo. Ele irá ensinar o Dhamma, com o significado e fraseado corretos, que é admirável no início, admirável no meio, admirável no final; e ele irá revelar uma vida santa que é completamente perfeita e imaculada. Ele será acompanhado por milhares de bhikkhus tal como eu sou acompanhado por centenas.

“Então o Rei Sankha irá reconstruir o palácio que uma vez foi construído para o Rei Mahā-Panada e tendo ali vivido, ele irá renunciá-lo e presenteá-lo para os contemplativos e Brâmanes, os mendigos, os transeuntes, os destituídos. Então, raspando o cabelo e a barba, ele irá vestir os mantos de cor ocre e deixar a vida em família pela vida santa sob a orientação do supremo Metteyya. Permanecendo só, isolado, diligente, ardente e decidido, em pouco tempo, ele alcançará e permanecerá no objetivo supremo da vida santa pelo qual membros de um clã deixam a vida em família pela vida santa, tendo conhecido e realizado por si mesmo no aqui e agora.

“Bhikkhus, sejam ilhas para vocês mesmos, refúgios para vocês mesmos, buscando nenhum refúgio externo; com o Dhamma como a sua ilha, o Dhamma como o seu refúgio, buscando nenhum outro refúgio. E como, um bhikkhu é uma ilha para ele mesmo … ? Quando ele permanece contemplando o corpo como um corpo, ardente, plenamente consciente e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo; quando ele permanece contemplando as sensações como sensações, … quando ele permanece contemplando a mente como mente, … quando ele permanece contemplando os objetos mentais como objetos mentais, ardente, plenamente consciente e com atenção plena, tendo colocado de lado a cobiça e o desprazer pelo mundo.

“Mantenham-se no seu próprio domínio bhikkhus, no seu território ancestral. Se vocês assim o fizerem, o seu tempo de vida irá se incrementar, a sua beleza irá se incrementar, a sua felicidade irá se incrementar, a sua riqueza irá se incrementar, seu poder irá se incrementar.

“E qual é o tempo de vida para um bhikkhu? Neste caso, um bhikkhu desenvolve a base do poder espiritual que possui concentração devido ao desejo e às formações volitivas do esforço. Ele desenvolve a base do poder espiritual que possui concentração devido à energia e às formações volitivas do esforço. Ele desenvolve a base do poder espiritual que possui concentração devido à mente e às formações volitivas do esforço. Ele desenvolve a base do poder espiritual que possui concentração devido à investigação e às formações volitivas do esforço. Ao praticar com freqüência essas quatro bases do poder espiritual, ele poderá se quiser, viver por todo um século, ou a parte que faltar para um século. Isso é o que chamo de tempo de vida para um bhikkhu.

“E o que é a beleza para um bhikkhu? Neste caso, um bhikkhu pratica a conduta correta, ele vive contido pelas regras do Patimokkha, perfeito na conduta e na sua esfera de atividades, temendo a menor falha ele treina adotando os preceitos de virtude. Essa é a beleza para um bhikkhu.

“E o que é a felicidade para um bhikkhu? Neste caso um bhikkhu, afastado dos prazeres sensuais entra no primeiro jhana, segundo, terceiro, quarto jhana. Essa é a felicidade para um bhikkhu.

“E o que é riqueza para um bhikkhu? Neste caso um bhikkhu, permanece com o coração pleno de amor bondade, permeando o primeiro quadrante com a mente imbuída de amor bondade, da mesma forma o segundo, da mesma forma o terceiro, da mesma forma o quarto; assim, acima, abaixo, em volta e em todos os lugares, para todos bem como para si mesmo, ele permanece permeando o mundo todo com a mente imbuída de amor bondade, abundante, transcendente, imensurável, sem hostilidade e sem má vontade. Depois, com a mente imbuída de compaixão, … com a mente imbuída de alegria altruísta, … com a mente imbuída de equanimidade, … ele permanece permeando o mundo todo com a mente imbuída de equanimidade, abundante, transcendente, imensurável, sem hostilidade e sem má vontade. Essa é a riqueza de um bhikkhu.

“E o que é o poder para um bhikkhu? Neste caso, um bhikkhu, com a eliminação das impurezas, permanece num estado livre de impurezas com a libertação da mente e a libertação através da sabedoria, tendo conhecido e manifestado isso para si mesmo no aqui e agora. Esse é o poder para um bhikkhu.

“Bhikkhus, eu não considero que exista um outro poder tão difícil de ser conquistado quanto o poder de Mara. É apenas acumulando estados benéficos que o mérito se incrementa.”

Isso foi o que disse o Abençoado. Os bhikkhus ficaram satisfeitos e contentes com as palavras do Abençoado.